Mortes e pessoas mutiladas em acidentes com trem, casas danificadas com rachaduras, barulho prejudicial do trem, falta de água, além de dificuldades no acesso a unidades de saúde e escolas devido às estradas precárias são alguns dos problemas apontados por moradores de comunidades afetadas pelo ramal ferroviário da Vale em Parauapebas.
As questões foram apresentadas e debatidas na audiência pública promovida pela Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que investiga a Mineradora Vale acerca dos impactos da construção/operação do ramal ferroviário no município. O debate foi realizado na manhã deste sábado (24), na Câmara Municipal de Parauapebas, e contou com a participação dos vereadores, de secretários municipais, de representantes da Vale e de associações de bairros e vilas atingidas pelo ramal, além da população em geral.
A CPI da Vale é composta pelos seguintes vereadores: Israel Miquinha (PT), que é o presidente e dirigiu os trabalhos da audiência pública; Josivaldo da Farmácia (Progressistas), que é o relator; Zé do Bode (MDB), Léo Márcio (Pros) e Joel do Sindicato (PDT). Além dos membros da comissão, estiveram presentes na audiência pública os vereadores Leandro do Chiquito (Pros), Raianny Rodrigues (Pros), Francisco Eloecio e o presidente da Câmara, Rafael Ribeiro (MDB).
Ramal ferroviário e os problemas
O ramal ferroviário, que teve sua construção iniciada em 2014, tem 101 quilômetros de extensão e interliga a Estrada de Ferro Carajás, em Parauapebas, à região da mina do S11D, em Canaã dos Carajás.
Em Parauapebas, tanto famílias da zona urbana quanto da zona rural afirmam ser afetadas pela linha férrea e acusam a Vale de não cumprir com as compensações acordadas para amenizar os dados causados pela obra.
Representante da Associação de Moradores da Vila Onalício Barros, o senhor Paraíba acusou a Vale de não cumprir com as condicionantes. “Meu lote foi cortado ao meio e até hoje eu estou a ver navios. Eu sofri e estou sofrendo os impactos sociais do ramal ferroviário. Na época da implantação nós discutimos sobre a questão de energia, estrada, escola e investimentos, mas o que a gente viu foi muito pouco. Estamos falando de famílias que tem suas casas rachadas, que não conseguem chegar à escola porque não tem estrada. A Vale usa energia e comunicação boas, que as linhas de transmissão passam dentro das comunidades e as comunidades não têm energia e comunicação.”
O representante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), Antônio Conceição, morador da Vila Palmares 2, enumerou os “crimes” da mineradora. “Nesses 29 anos da Palmares, nós já perdemos três companheiros e cinco foram mutilados pelo trem. Houve aumento populacional desordenado devido à duplicação do ramal, além da contaminação do Rio Catete, com elevados níveis de metais pesados. Nós não somos contra a mineração, sabemos que ela é necessária, mas é de responsabilidade da Vale investir em geração de renda permanente, para garantir o futuro dos nossos jovens”.
Morador do Bairro Cidade Jardim, Romero Felizardo, relatou problemas com o fornecimento de água. “Os poços artesianos do Cidade Jardim estão secando no verão, porque depois que construíram o ramal ferroviário, perfuraram as rochas e atingiram o lençol freático, a água está ficando após o ramal.”
Morador do Bairro Tropical, Gutemberg Silva, relatou que na sua região também há casas rachadas e falta de água. Ele cobrou levantamento das condicionantes que foram impostas a Vale, para saber o que ela cumpriu e o que não foi atendido. E alertou para a concessão de novas licenças que forem solicitadas pela mineradora. “É preciso estar atento quando for licenciar a Serra Norte, N3 e N1.”
O representante da Associação dos Trabalhadores Rurais do PA Santo Antônio, Hitler Lopes, relatou que os moradores ficam ilhados, pois um trecho da ferrovia tem um viaduto que alaga e impossibilita os moradores de se locomoverem. Outro problema é que muitos animais morrem atropelados, pois não há nenhum tipo de proteção na linha férrea. E o mais grave, segundo ele, são as “ameaças” feitas pela mineradora aos moradores devido à falta de regularização fundiária. “Um dos maiores impactos é a questão da regularização fundiária. Hoje, muitas famílias não estão aqui por medo, medo de serem desapropriadas a qualquer hora”.
Representando o Movimento pela Soberania Popular na Mineração (MAM), Diely Amorim, enfatizou a importância de a população ter consciência dos impactos positivos e negativos causados pela mineração, para cobrar. “Os impactos da mineração dizem respeito, sobretudo, à comunidade civil, ao povo de Parauapebas.”
CPI
O presidente da CPI informou que há meses a comissão tem realizado reuniões com moradores nas comunidades afetadas pelo ramal ferroviário. E a constatação é de que os danos são realmente grandes à população e a Mineradora não tem cumprido as condicionantes.
“Temos casas rachadas, acidentes com pessoas e animais, desvalorização dos imóveis, problemas com ruídos. Precisamos que a Vale implante um programa de desenvolvimento sustentável em nossa cidade, que ela possa se conscientizar que tem que fazer reparos, nossa população não pode sofrer as mazelas de um projeto, seja qual for”, ressaltou Miquinha.
O Relator da CPI, Josivaldo da Farmácia, também cobrou maior contrapartida da Vale. “Precisamos de projetos sociais que possam ser desenvolvidos para ajudar a comunidade. Não temos parceria com município para gerar emprego e renda. Essa audiência é para levarmos à prefeitura e à Vale sugestões para melhorar a vida da população”.
Léo Márcio explicou que a CPI foi criada para averiguar o que era verdade quanto às denúncias contra a Vale e com os trabalhos têm comprovado que é verdade. “A Vale é a principal fonte de renda do município, mas não podemos esquecer os danos causados. Sabemos que a Vale arrecada bilhões na nossa cidade, então, dar retorno para população não é favor, é obrigação.”
Joel do Sindicato comparou investimentos feitos pela Vale em outros municípios onde ela atua e concluiu que proporcionalmente em Parauapebas é bem menor. “A Vale tem diminuído a extração aqui, com isso nós perdemos arrecadação, mas a degradação do meio ambiente é muito grande e o investimento não está no nosso município”.
O presidente da Câmara, Rafael Ribeiro, também ressaltou a necessidade de que a Vale cumpra as condicionantes. “A Vale tem uma parcela de contribuição com o município, mas precisamos de muito mais, precisamos verticalizar nossa produção, precisamos que a Vale tenha mais responsabilidade social.”
O Gerente de Relacionamento Institucional da Vale, Luiz Veloso, afirmou que a empresa não vai e nem pode substituir o poder público, e informou que a empresa tem dado a contrapartida acordada para implantação do ramal ferroviário.
“O ramal ferroviário passou por todos os ritos de licenciamento. Hoje ele opera com todas as licenças em dia, suas condicionantes algumas foram cumpridas, outras estão em andamento. Estamos aqui para ouvir, ao final ver o relatório para que possamos dar os melhores encaminhamentos, sem perder o diálogo”. Mas acrescentou que a Vale não pode fazer tudo sozinha. “É um conjunto de esforços, não é um segmento que vai resolver os problemas da cidade. Precisamos unir forças para que cada um, dentro da sua responsabilidade, faça sua parte. A Vale está aberta para esse diálogo. Temos uma forte massa salarial dentro deste município, temos obras relevantes que dão estruturação para Parauapebas e temos convicção de que vamos conseguir resolver boa parte desta problemática”, destacou.
Fase final
O presidente da CPI, vereador Miquinha, informou que em breve a comissão finalizará os trabalhos. “Estamos reunindo as informações para prestar contas à sociedade. Ainda vamos conversar com mais pessoas e com a Vale antes de enviar o relatório para o Ministério Público”, finalizou.
Texto – Nayara Cristina / Fotos: Elienai Araújo / AscomLeg 2023
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Assessoria de Comunicação Legislativa (AscomLeg)
Câmara Municipal de Parauapebas